ITCMD: Cobrança Condicionada à Edição de Lei Complementar nas Doações e Heranças de Bens Localizados no Exterior

O Supremo Tribunal Federal – STF decidiu no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 851.108, realizado em 26/02/2021, que os Estados e o Distrito Federal não possuem competência para legislar no que se refere à cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) sobre as doações e heranças de bens localizados no exterior.

Os art. 155, I, §1º, I a III, alíneas “a” e “b”, da Constituição Federal de 1988 possuem o seguinte teor:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:     (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

(…)

§ 1º O imposto previsto no inciso I:   (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

(…)

III – terá competência para sua instituição regulada por lei complementar:

a) se o doador tiver domicílio ou residência no exterior;

b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior.

Ou seja, para que haja a cobrança do imposto, deve haver lei complementar para definir a competência de sua instituição em relação  às doações e herança no exterior.

No caso analisado, a contribuinte recebeu, em 2005, a título de doação testamentária, um imóvel localizado na Itália e quantia em moeda estrangeira, devidamente informados em sua Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física à época.

Alegou que o Estado de São Paulo se antecipou à edição de lei complementar de caráter nacional, instituindo o ITCMD por meio de lei ordinária, contrariando a competência reservada pela Constituição Federal, exclusivamente ao diploma complementar.

O imposto foi instituído pelo ente federativo com a publicação da Lei nº 10.705/2000, regulamentada pelo Decreto nº 46.655/2002 (Regulamento do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos do Estado de São Paulo – RITCMD/SP), dispondo em seu art. 3º o que segue:

“Artigo 3.º – O imposto é devido nas hipóteses a seguir especificadas, sempre que o doador residir ou tiver domicílio no exterior, e, no caso de morte, se o “de cujus” possuía bens, era residente ou teve seu inventário processado fora do país (Lei 10.705/00, art. 4º):
I – sendo corpóreo o bem transmitido:
a) quando se encontrar no território do Estado;
b) quando se encontrar no exterior e o herdeiro, legatário ou donatário tiver domicílio neste Estado;
II – sendo incorpóreo o bem transmitido:
a) quando o ato de sua transferência ou liquidação ocorrer neste Estado;
b) quando o ato referido na alínea anterior ocorrer no exterior e o herdeiro, legatário ou donatário, tiver domicílio neste Estado.”

Contudo, após quase 5 (cinco) anos da data do recebimento da doação testamentária, houve a cobrança do ITCMD, possivelmente pelo cruzamento de dados da informação constante na ficha “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis” da Declaração da Pessoa Física apresentada pela contribuinte, ao se ter utilizado a palavra “doação”.

Nos autos do processo, o Estado de São Paulo questionava acórdão do Tribunal de Justiça local (TJ-SP) que, ao negar apelação, não permitiu ao governo estadual o poder de cobrar o ITCMD sobre a doação testamentária.

O TJ-SP considerou inconstitucional o dispositivo da Lei estadual 10.705/2000 regulamentando a cobrança, sob o fundamento da inexistência de lei complementar.

Na decisão do Recurso Extraordinário (RE) 851.108 com repercussão geral (Tema 825), foi estabelecido que é vedado aos Estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional.

Foi também objeto da decisão a modulação dos seus efeitos, de modo que a decisão se aplica apenas para as situações depois da publicação do acórdão, ressalvando as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo momento, onde haja a discussão sobre:

  1. a qual Estado o contribuinte deve efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação; e
  2. a validade da cobrança desse imposto, não tendo sido pago anteriormente.

Sendo assim, para que a cobrança do ITCMD seja constitucional, no que se refere às doações e heranças no exterior, faz-se necessária a existência de lei complementar, observando que cabe ao contribuinte que se sentir lesado, recorrer ao judiciário para assegurar os seus direitos.

Fonte: Assessoria Técnica FecomercioSP

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